Último dia no Chile: A CONFECH pactua criminosamente com o governo Piñera

Mariana Borzino
Brigada Indignada do Vamos à Luta no Chile

Hoje, 13 de setembro, é meu último dia no Chile. Recebemos a notícia de que a vocera da CONFECH de Santiago, Camila Vallejo, convoca todos os estudantes para uma manifestação cultural amanhã às 10 da manhã.  Convoca hoje, às 19:00 da noite, para uma atividade cultural amanhã de manhã, autorizada pelo governo de Piñera.
A marcha chamada em cima da hora e autorizada pelo governo neoliberal de Piñera tem um propósito claro e cínico: desgastar e desmobilizar o movimento dos estudantes, pois se não tivesse seria uma marcha de protesto e radicalização.
Não é só o governo que se sente incomodado com o avanço e com o nível de politização que os estudantes e a população alcançaram; o próprio Partido Comunista está se vendo encolher diante da visão crítica que estudantes e trabalhadores passaram a ter ante as últimas ações do mesmo.
Os estudantes que hoje estão na universidade, foram também parte da Revolução dos Pinguins, em 2006, em pleno governo de Michele Bachellet.  As mobilizações que vemos hoje, ao contrário do que nos é transmitido, não foram formadas pela CONFECH. O movimento estudantil já estava organizado, porém, num golpe oportunista, a CONFECH – aparelhada pelo Partido Comunista chileno – se adiantou e convocou as mobilizações iniciais.
Para isso, o PC se encarregou de preparar duas figuras de expressão: Camila Vallejo e Giorgio Jackson. Prática comum a todos os PC’s é criar figuras públicas que no discurso da televisão parecem ser os próximos bastiões da luta socialista, mas no conteúdo e forma são altamente burocratas e oportunistas.
Não à toa, Camilla e Giorgio sentaram-se a mesa de negociação com Piñera. Não à toa só foram chamados os setores dirigidos pelo PC (CONES, CONFECH, Colegio de Professores). Não à toa a ACES, que é uma entidade combativa e que leva as pautas e bandeiras das bases, não foi chamada. Os setores dirigidos pelos burocratas estalinistas negociaram uma pauta ”amarila”, para nós tupiniquins, uma pauta “chapa branca”.  Camila, que fala em democracia e diz defender a educação, simplesmente ignorou o fato da ACES não ter sido convocada para a mesa. Algo muito parecido com que a entidade que se diz de luta pelos lados de cá faz, não? A UNE e a CONFECH são frutos da mesma coisa: burocracia e privilégios.
O piso mínimo para qualquer tipo de negociação deve ser o da educação gratuita. O que os estudantes e trabalhadores chilenos querem é não ter que pagar mais pela educação, não precisar mais ter que decidir qual filho vai pra universidade e qual vai trabalhar, pois todos têm o direito a uma educação gratuita e de qualidade.
Defender o atual modelo educacional chileno hoje é defender o que Pinochet criou. É defender as universidades privadas, o lucro na educação,  o sucateamento do ensino superior e o endividamento das famílias em prol dos empresários da educação. O que a CONFECH defende, hoje, é apenas uma educação pública e de qualidade. Mas pensemos: público não necessariamente implica na gratuidade. Qualidade não necessariamente implica acesso a todos.

 Não foi sem motivo que as pautas sobre gratuidade e educação 100% estatal não foram negociadas, tampouco levadas a mesa (já que é a ACES que levanta essas bandeiras). A razão é simples e óbvia: o Partido Comunista é dono de várias universidades e centros de ensino. Mexer nesses dois pontos significa mexer no próprio bolso do PC chileno.
O que o partidão não parece se dar conta é que corroborando com o lucro, precarização e acesso restrito à educação está seguindo a cartilha do Banco Mundial. E estamos vendo pelo mundo afora que há indignados espalhados por todos os cantos dizendo não aos ajustes, não às burocracias e não a todo tipo de ataque.
E os estudantes chilenos dizem em alto e bom som: não nos contentamos mais com reformas! Não queremos mais becas e créditos! Queremos a renacionalização do cobre para financiar a educação! Queremos um novo sistema educacional, que seja do povo e para o povo! Chega de endividamentos, chega de lucros! Educação não é negócio, não é mercadoria! É direito!

Por isso hoje, mais do que nunca, devemos ser estudantes, devemos ser trabalhadores. Devemos nos organizar e cuspir de volta a falácia que tentam nos empurrar goela a baixo os governos dos ricos, com seus falsos discursos democráticos!
Devemos nos unir e sermos protagonistas da queda dessa estrutura nefasta e criminosa que se encastela na UNE, na CONFECH e em todos os setores burocráticos, neoliberais, capitalistas e burgueses mundiais.
Volto do Chile com a certeza e a clareza de que a luta é uma só; de que um estudante brasileiro tem em si a mesma gana e a mesma força que um estudante chileno. E cabe a nós decidir (nas palavras de ordem chilenas) “quem rege a batuta – os estudantes, ou os filhos da puta”.