Aumenta a repressão na Síria contra o movimento de protestos



Dominique Lucas 

Em Damasco 
Le Monde

Dois dias após as grandes manifestações de sexta-feira (8), a tensão ainda não baixou na Síria. Em diversas cidades do país, os movimentos de protestos continuaram, no sábado e no domingo, em uma mistura de novas passeatas e funerais de manifestantes. As forças de segurança e o exército intervieram em diversos locais, às vezes atirando para dispersar a multidão. Os deslocamentos dentro do país estão sendo monitorados de perto, e o acesso a determinadas cidades foi proibido à imprensa estrangeira, tornando extremamente difícil a verificação das informações que chegam a conta-gotas até a capital.

Foi na cidade de Deraa, na fronteira com a Jordânia, que os atos de violência mais mataram. O número de manifestantes mortos durante a repressão de sexta-feira poderá passar de vinte, segundo informações fornecidas por organizações de direitos humanos sírias. Os funerais no dia seguinte também foram marcados por atos de violência.

Raiva atiçada

No domingo, o Ministério do Interior publicou um comunicado acusando “indivíduos instigados pela vingança e intrusos (…), encorajados por meios estrangeiros bem conhecidos e de conivência com as campanhas de incitação veiculadas por canais via satélite e redes de internet” de terem “se infiltrado entre os manifestantes e nos cortejos dos funerais dos mártires” e de terem “atirado cegamente a fim de provocar uma cisão entre os cidadãos e os agentes de segurança (…) que respeitavam a ordem de não abrir fogo, causando inúmeros mortos e feridos”. O mesmo comunicado adverte que “não há mais espaço para indulgência e para clemência” e convoca os sírios a denunciarem os “sabotadores”.


Segundo as autoridades, 19 policiais foram mortos na sexta-feira em Deraa por “grupos armados”, cuja existência é negada pelos manifestantes. Além disso, a redatora-chefe do jornal oficial “Tishrine” foi demitida após ter declarado que em Deraa houve “violação das ordens” dadas às forças policiais de não atirar nos manifestantes.

No domingo, segundo moradores, vários veículos do exército teriam entrado na cidade industrial de Homs, 160 quilômetros ao norte de Damasco, para dispersar as manifestações. Segundo seus depoimentos, a raiva foi atiçada pela recusa das autoridades em entregar aos manifestantes os corpos de dois deles que foram mortos na sexta-feira.

Também houve repercussões preocupantes em Baniyas, cidade portuária e estratégica situada à beira do Mediterrâneo. Após a prece da manhã de domingo, os fieis de várias mesquitas – único lugar possível de reunião, uma vez que o estado de emergência proíbe qualquer forma de concentração – foram expulsos pelos tiros das forças de segurança.

Essa cidade, que abriga o terminal do oleoduto que vem de Kirkouk, no Iraque, havia se juntado ao movimento de protestos que saiu de Deraa, sem, no entanto, que a situação se degenerasse, ao contrário de Lattaquié, outra cidade portuária, situada 5,5 quilômetros ao norte, e onde confrontos entre manifestantes, governistas e forças de segurança resultaram em pelo menos 12 mortos e 150 feridos.
No início, segundo uma fonte oficial de Damasco, as primeiras reivindicações em Baniyas só diziam respeito ao uso do niqab (véu integral) nas escolas – concedido por um decreto do presidente Bashar Al-Assad – e “estabelecimentos escolares não mistos”. Vídeos no YouTube mostram a escalada dos protestos. Os mais antigos mostram pequenos protestos, e depois uma manifestação noturna no bairro sunita de Ras Al-Nabaa. Em um vídeo datado de sexta-feira, centenas de pessoas pediam pelo “fim da corrupção” e pela “liberdade para todos”.

No mesmo lugar, no dia seguinte, uma multidão gritava “o povo quer a queda do regime”, um slogan ainda proibido que provavelmente desencadeou a intervenção das forças armadas. Testemunhas garantiram que um “ataque conduzido pela guarda republicana” no bairro e em torno da mesquita Al-Rahman resultou em 8 a 10 mortos e diversos feridos. As mesquitas teriam então utilizado seu alto-falante para chamar os habitantes a socorrerem as vítimas.

Na noite de domingo, a Sana, agência oficial de notícias, garantiu que uma unidade do exército foi pega em uma emboscada na cidade de Baniyas, lamentando “nove mártires, entre eles dois oficiais”. Algumas horas mais tarde, moradores da cidade vizinha de Muadamiyeh convocavam, pelo Twitter, uma passeata em apoio aos manifestantes de Baniyas.