Especialistas em relações internacionais acreditam que a opção pela intervenção militar na Líbia não foi a melhor saída para resolver conflito no país norte-africano, já que não cumpre nem seu objetivo “oficial”, que era o de proteger civis. Esse consenso foi resultado de um debate com Reginaldo Nasser, professor de Relações Internacionais da PUC (Pontífice Universidade Católica) e Deisy Ventura, professora de direito internacional na USP (Universidade de São Paulo). Intitulado “O conflito na Líbia e a intervenção internacional”, o encontro, acompanhado pela reportagem do Opera Mundi, foi organizado pelo Centro Acadêmico Guimarães Rosa, do curso de Relações Internacionais da USP. O evento ocorreu na última sexta-feira(29/04), no campus da universidade, em São Paulo.
Nasser fez uma breve contextualização das recentes manifestações no mundo árabe e deixou claro que a Líbia surgiu como a opção para que os Estados Unidos e outras potências mundiais pudessem interferir na região.
“Os Estados Unidos querem marcar presença nesses processos de transformações. Nos outros países, não houve condições para uma ação mais efetiva. A possibilidade de guerra civil deu o argumento que eles acharam suficiente para justificar uma invasão”, diz o professor da PUC.
Há um claro eufemismo no termo “intervenção militar” que, no caso líbio, substitui a palavra “guerra”, afirma Deisy. A OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte ) escolheu um lado para lutar, ela está reforçando um lado da força contra o outro.
“Deveria haver um questionamento sobre as notícias que informam que os exércitos atacaram escritórios da Kadafi e acertaram outros alvos. A resolução aprovada pelo ONU que permite a intervenção militar não dá liberdade para ações como essas”, alerta a professora da USP.
Direitos Humanos
Essa ação, que se baseia na resolução de número 1973 do Conselho de Segurança da ONU, é justificada pelo conceito da “responsabilidade de proteger”, explica Deisy. Quando uma nação não consegue garantir a preservação dos direitos humanos da sua população, o restante da comunidade internacional teria o “dever de intervir”. No entanto, esse “dever” não permite e nem legítima uma ação militar que tem como objetivo a troca de um regime.
Para Nasser, a justificativa que objetivo é a “proteção de civis” não é verdadeira. O que eles querem é participar do processo que deposição de um regime e, posteriormente, influenciar na construção de um novo. “As forças militares já estão na Líbia há vários dias. Mesmo assim, não há notícia de que as condições humanitárias melhoraram”, completa Deisy.
Posição do Brasil
Os palestrantes concordam que o Brasil acertou ao não apoiar a ação militar na Líbia. Segundo eles, isso mostra que o governo brasileiro entende que se deveria buscar outras opções que não implicassem o uso da força. No entanto, alguns dos ouvintes da palestra questionaram se “a comunidade internacional deveria, então, assistir o que estava acontecendo na Líbia?”
Deisy respondeu que já se sabia que a intervenção internacional não iria diminuir o sofrimento da população. “Estamos vendo que o país está praticamente mergulhado em uma guerra civil. A forma como as forças militares estão agindo pode acabar intensificando isso”. “Há relatos que Kadafi quis negociar com a ONU. Para isso, ele pediu que fosse enviado um representante para a Líbia. Negaram dizendo que ele não é confiável. De fato, ele não é, mas há alguns anos é interessante perceber que não havia essa desconfiança em relação a ele”, concluiu Nasser.