O Chile despertou e aponta o caminho!

Por Caio Sepúlveda – Militante da Juventude Vamos à Luta

Entre os dias 8 e 15 de novembro estive no Chile para apoiar as mobilizações que tem tomado conta do país. Nesse texto, relato um pouco de como foi a experiência de presenciar uma rebelião popular sem precedentes e as lições que esse processo nos ensina. Nessa jornada estive ao lado do Movimento Socialista dos Trabalhadores (Seção da Unidade Internacional de Trabalhadores e Trabalhadoras – Quarta Internacional – UIT-QI)

O “modelo chileno” significa nenhum direito social para o povo trabalhador
O povo Chileno sofre até hoje com o duro legado deixado pela ditadura Pinochet. É um modelo brutal, de privatização total dos serviços públicos e dos direitos sociais. A educação e a saúde não são gratuitas. A previdência é totalmente privada, gerando a miséria dos idosos. É o único país do mundo onde até a água é privatizada. Um sistema econômico que garante o lucro dos grandes empresários enquanto o povo não tem nenhum direito social garantido. Piñera, da direita clássica do país, segue esse mesmo modelo, jogando a conta nas costas dos trabalhadores e da juventude chilena. Esse é o “modelo” que Bolsonaro e Paulo Guedes querem implantar no Brasil.
Mas no Chile a paciência se esgotou completamente. 

Não são apenas 30 pesos
O processo de mobilizações começou com o aumento de 30 pesos na tarifa do metrô. Diversos estudantes começaram a pular (“evadir”) as catracas, se rebelando contra a alta das tarifas, com muito apoio da população a essa atitude (Se vê, por toda Santiago, pichações dizendo “Evade”). Rapidamente o movimento se ampliou e tomou as ruas, com marchas multitudinárias todos os dias. Com o ápice na manifestação com mais de um milhão de pessoas no dia 25 de outubro e uma greve geral no dia 12 de novembro.  Não é por 30 pesos, são 30 anos de exploração e miséria. Os estudantes e as mulheres estão na linha de frente, mas toda a população está indo aos atos. Se tornou um hábito em Santiago, sair do trabalho as 17h e ir à Praça Italia para marchar. Todos os dias acontecem manifestações massivas no final da tarde, os ônibus param de funcionar (ou funcionam em menor número) e as pessoas vão caminhando. Nos atos, vemos famílias, estudantes, trabalhadores, mulheres e indígenas. As pessoas levam apitos, cornetas, instrumentos ou batem panela. Se vê também muitas bandeiras mapuches, um povo indígena que resiste ao extermínio há
400 anos e é muito respeitado nos protestos. E quem não vai à marcha, apoia. Por todo lado se discute política e os rumos do país. 

A mobilização demonstra que é possível vencer!
O governo Piñera respondeu com uma repressão brutal: a todo tempo se respira gás de pimenta e a polícia dispara com munição letal. Já são mais de 20 pessoas mortas, dezenas de desaparecidos e presos políticos, mais de 200 perderam a visão com tiros direcionados para os olhos dos manifestantes, diversos torturados e mulheres estupradas pelos militares e pela polícia. Mas mesmo assim, a luta segue. A cada dia os manifestantes encontram novas formas de se proteger e enfrentar a repressão. Na primeira linha, os estudantes se protegem como dá, com panos para aliviar o gás lacrimogêneo, óculos de proteção, escudos e jogando pedras. O estado de emergência com toque de recolher foi derrotado, e os militares foram obrigados a sair das ruas. Há um ódio generalizado ao exército e os pacos (que é como é conhecida a polícia), que são rechaçados e xingados a todo o tempo nas ruas e nas paredes da cidade. A palavra de ordem mais agitada é o Fora Piñera!
Infelizmente, a esquerda reformista está na contramão da luta. Tanto o PS e o PC quanto a Frente Ampla atuam como bombeiros do regime (ver páginas centrais) tentando canalizar tudo para a via institucional o que só beneficia Piñera. Mas a luta avança. Em todo o Chile surgiram assembleias de bairros autoconvocadas, que organizam a luta, a autodefesa e debatem todas as questões políticas do bairro e do país. É um processo impressionante de organização pela base, com democracia
direta, que acontece mesmo nos bairros e cidades pequenas. Mesmo com o grande acordão do governo Piñera e parte da oposição, de convocar uma nova constituição via plebiscito, não fez parar as mobilizações: O povo nas ruas quer é que Piñera e todo esse congresso corrupto caia. E que aí sim se discuta a nova constituição em uma Assembleia Constituinte livre, soberana e democrática. Uma constituição que garanta dignidade, serviços públicos e direitos sociais. 

Campanha de solidariedade!
É necessário cercar de solidariedade a luta no Chile.  O coletivo Vamos à luta e nossa corrente a CST é parte ativa dessa batalha com a campanha internacional que já estamos fazendo. Como com o abaixo assinado que estamos levando em nossos locais de trabalho e estudo, em apoio à luta no Chile e exigindo que o governo brasileiro rompa relações diplomáticas com o assassino Piñera.
 Os companheiros do MST (UIT-QI) têm batalhado pela continuidade do processo nas ruas e pela coordenação das assembleias territoriais nacionalmente, para que as assembleias dirijam esse processo.  Que Piñera caia pela força da mobilização. Por justiça aos assassinados e feridos, com punição ao governo assassino, aos milicos e aos carabineiros envolvidos. Além de uma nova constituição, é necessário um plano econômico emergencial para resolver os problemas que passa o povo chileno. Seguir
nas ruas por um governo dos manifestantes, dos que estão nos piquetes, dos trabalhadores, da juventude em luta e dos setores populares.
Sem dúvida é um exemplo a ser seguido: Para derrotar o projeto autoritário e ultraliberal de Bolsonaro precisamos ocupar as ruas como fazem os chilenos. Se o modelo de Bolsonaro e Guedes é o de Piñera e Pinochet, nosso “modelo” deve ser o que a juventude, trabalhadores e mapuches apontam no Chile, enfrentando o ajuste e a repressão nas ruas através da ação direta.