Em meio a pandemia de COVID-19 o governo Bolsonaro viu uma grande oportunidade de “passar a boiada” de seu projeto de sucateamento das universidades públicas. Tentou atacar as cotas, nomeou reitores biônicos e seu ex-ministro da educação, Abraham Weintraub, nos deixou de “presente” a Portaria n° 544 de 16 de junho de 2020, que regulamentou a aplicação do Ensino Remoto (ER) nas universidades brasileiras sem sequer apresentar os marcos regulatórios ou método de implementação da portaria, isentando o próprio MEC da responsabilidade sob os desdobramentos da medida, se conformando enquanto mais uma política unilateral do governo federal. Sem oferecer resistência, as reitorias do Brasil afora se apressaram em aprovar e implementar essa modalidade, passando por cima da já pouca democracia nas universidades e instaurando um modelo que em curto prazo exclui e precariza o aprendizado de dezenas de milhares de estudantes, caminhando para que a médio e longo prazo se configure enquanto um um passo irreversível rumo ao projeto de desmonte e privatização das universidades públicas.
Somos contra o ensino remoto porque ele se constitui como um modelo de oferta enxuta, barata, que aligeira a formação, precariza o trabalho docente e está em consonância com o atual momento de desfinanciamento da educação. Além disso, o ensino remoto aprofunda a evasão e exclusão de estudantes de baixa renda, cotistas, negros, indígenas, quilombolas, moradores de periferias, LGBTs, pessoas com deficiência e todos aqueles e aquelas que não dispõem das condições básicas para assistir aula nessa modalidade, como boa internet, ambiente adequado aos estudos, condições psicológicas e financeiras, além dos estudantes que estão tendo que arriscar suas vidas para sobreviverem em meio a pandemia. O financiamento de toda a estrutura necessária à entrada, permanência e formação de estudantes da rede pública é de responsabilidade total do Estado e não pode ser transferida para os estudantes e trabalhadores das Instituições Federais de Ensino Superior (IFESs).
Um importante exemplo dos impactos do ER na vidas dos estudantes trabalhadores é o drama vivido pelos discentes de instituições de ensino superior privadas, onde a implementação da nova modalidade de ensino foi feita quase que simultaneamente à suspensão de atividades presenciais. Hoje, praticamente seis meses após o início das medidas de isolamento social nas universidades, faculdades e escolas, esse grupo já atinge números de evasão que chega a 30%, justificadas em sua maioria pela falta de acesso aos equipamentos necessários para assistir aula, dificuldades devido a intensificação da jornada de trabalho, perda de emprego ou sobrecarga com as atividades domésticas. Ademais, a crise econômica intensificada pela pandemia afetou gravemente a renda das famílias da classe trabalhadora, que tem sofrido ainda mais para arcar com as altas mensalidades do ensino superior privado, por isso, é necessário reivindicarmos a redução das mensalidades, sem reduzir os salários de funcionários e professores, além de políticas de permanência para estudantes bolsistas
Somos contra o ensino remoto porque as reitorias prometeram auxílios de inclusão digital, garantindo bolsas e equipamentos, mas só foram disponibilizados editais extremamente precários e inacessíveis como o da Universidade federal do Pará(UFPA), maior universidade do país em número de estudantes, cujo edital garantirá auxílio para menos de 4 mil estudantes, quando a demanda estudantil ultrapassou os 10 mil pedidos. Além disso, mesmo esses programas extremamente precários têm sua existência ameaçada por um corte de 18,2% nas verbas discricionárias das IFES, anunciado para 2021. Esse corte atingirá em cheio o já precário Plano Nacional de assistência estudantil, ameaçando sua continuidade.
Somos contra o ensino remoto porque esse modelo improvisado, na forma que está sendo aplicado carrega consigo a privatização silenciosa das universidades públicas, pois as reitorias sob o argumento da urgência, abrem as portas para multinacionais da tecnologia como a Google, Microsoft e Facebook com suas plataformas e treinamentos. Essas empresas terão acesso a dados pessoais e funcionais, bem como informações sobre o que está sendo produzido nas universidades, que hoje corresponde a 95% de toda a pesquisa brasileira. Essas decisões em geral sequer passaram pelos conselhos universitários.
Exemplo disso são universidades como a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), onde vemos abertamente o financiamento do ensino remoto sendo realizado pela iniciativa privada através de parcerias com empresas de tecnologia sob pretexto de assegurar descontos na compra de equipamentos para as aulas online, bem como notas de agradecimento nominal a empresários que vêm investindo seu dinheiro nessa metodologia de ensino através de doações. Não podemos esquecer que o grande objetivo de Bolsonaro e Mourão para educação é a entrega das IFESs para iniciativa privada através de projetos como o Future-se, onde os bancos vão gerir todo o investimento, conteúdo e retorno financeiro/tecnológico que passe pelo ensino e pesquisa realizados dentro das universidades.
Somos contra o ensino remoto porque ele é parte do perverso discurso do “novo normal” que banaliza a morte de mais de 100 mil brasileiras/os. As propostas aprovadas pelas reitorias em geral, ao invés de permitir que os cursos cuja grade curricular exige aulas presenciais não adiram ao ER, orienta a atividades “híbridas” com disciplinas presenciais, pondo em risco a vida de estudantes, técnicos e professores. Além do mais, busca-se amenizar a insuficiência de bolsas, abrindo laboratórios e bibliotecas para o estudo presencial.
Esse mesmo modelo híbrido vem sendo utilizado para abafar a discussão sobre as condições estruturais das universidades brasileiras, onde as instituições de ensino, ao invés de construir um amplo debate e frente de luta contra seu sucateamento, pela ampliação dos investimentos e revogação da EC95 para possibilitar as reformas que garantiriam segurança e dignidade na futura retomada das atividades presenciais, contribuem com retornos precoces e precários, como no estado do Amazonas que mesmo com o grande número de mortes já inicia a retomada das aulas desde a educação infantil até o ensino superior. Somos contrários à volta às aulas antes da vacina ser disponibilizada para a população brasileira.
Somos contra o ensino remoto porque defendemos uma saída coletiva para um problema coletivo, em que nenhum estudante seja deixado para trás. Essa saída não será fruto de negociação com o governo de extrema-direita que declaradamente nos odeia, mas de nossa mobilização. Infelizmente, uma parcela das entidades estudantis optaram por apenas “reduzir danos”, a exemplo de setores da direção da União Nacional dos Estudantes (UNE) que impedem tomada de um posicionamento firme na batalha contra o Ensino Remoto e seus desdobramentos, que é hoje a principal pauta da juventude universitária. Tal postura acaba por colocar a entidade como mediadora dos interesses das reitorias e do próprio setor privatista, como no processo de implementação do ER na Universidade Federal Fluminense (UFF).
São princípios da Universidade pública a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, assim como a excelência acadêmica em sua formação. Sabemos que mesmo em períodos pré-pandemia, esses princípios nunca chegaram a se concretizar, não só por causa do contínuo desfinanciamento operado pelos governos que passaram, mas principalmente porque a estrutura da universidade brasileira ainda é a mesma da ditadura, voltada para o mercado. Contudo, diante do quadro que se configura, vemos o rápido aprofundamento da situação de precarização, basta olharmos para a degradante realidade socioeconômica e emocional em que se encontra a juventude brasileira, que se agrava durante o percurso da pandemia com as mais de um milhão de demissões, o crescimento da informalidade e o avanço dos índices de evasão escolar e acadêmica. É necessário batalhar para que as políticas de assistência estudantil sejam independentes do ER, ao contrário do que algumas reitorias estão propondo de somente oferecer bolsas para quem esteja matriculado em disciplinas remotas.
Não podemos esquecer que o projeto do Ministério da Educação de Bolsonaro é a implementação da agenda econômica de Paulo Guedes direcionada para a rede educacional, que os interesses das elites estão claramente sendo atendidos com suas políticas, à exemplo do próprio Guedes, que chega a lucrar R$1Bi com seus investimentos ativos no ensino privado à distância. É necessário reagir a estes ataques e construir uma Universidade feita pelo povo e para o povo!
Assim as entidades abaixo assinadas propõe:Construir no dia 14 de setembro um dia nacional de lutas contra o ensino remoto e por assistência estudantil, com atos presenciais, panelaços e mobilização nas redes. Unificar as lutas contra a política genocida de Bolsonaro, governadores e prefeitos. Que no dia 07 de setembro construamos grandes atos junto aos trabalhadores, ao movimento de mulheres, negro e indígenas contra Bolsonaro e seu projeto privatista e ultra liberal . Não à privatização! Todo o apoio a greve dos correios! Em defesa da Pesquisa e da soberania Nacional. Repudiamos a presença das multinacionais e demais empresas privadas de tecnologias nas IFES. Defendemos que a tarefa número 1 das universidades seja o enfrentamento da pandemia, luta da qual nossos pesquisadores e pesquisadoras têm sido linha de frente. Apoiamos todas as iniciativas de boicotes e de greves estudantis nos cursos, institutos e universidades, tocadas pelas entidades, organizações e coletivos de base. E que professorxs e estudantxs tenham real autonomia para não aderir ao Ensino Remoto.Contra o retorno das atividades presenciais em universidades e escolas! Pela ampliação do auxílio emergencial! Verba emergencial para que universidades públicas possam ampliar as iniciativas de combate a pandemia! Pautar a revogação imediata da EC 95; Suspensão do pagamento da Dívida pública e taxação das grandes fortunas! Que os ricos paguem a conta da crise! Fora Bolsonaro, Mourão, Guedes e seus aliados. Defendemos a realização de plenárias nacional e estaduais, reunindo entidades de base (CAs e DAs), entidades gerais (executivas de curso e DCEs), UEEs e a UNE para aprovação de um manifesto conjunto e aprovação de uma jornada nacional de lutas contra o Ensino Remoto, por Assistência e Permanência, pela redução das mensalidades nas universidades privadas e contra o retorno das atividades presenciais. Lutar por uma assistência estudantil que também contemplem a realização das atividades referentes à extensão e pesquisa nas Universidades; Repúdio à intervenção nas universidades; Construção de assembleias de base para debater a situação do ER nas universidades; Contra as modificações antidemocráticas nos projetos dos cursos, nos PDI e nos regimentos da graduação e Pós-graduação; Contra a lei 13.467, a MP 927, a Portaria 544 e 937; Confira as entidades assinantes e mande sua assinatura. http://bit.ly/ManifestoNacionalContraoERE
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