Eleição para reitoria da UFPA: qual universidade queremos?

No próximo dia 17/4 ocorrerá a consulta pública para eleição da Reitoria da Universidade Federal do Pará (UFPA), com quatro chapas em disputa, sendo duas delas oriundas da gestão atual. A chapa da situação “+ UFPA: Autonomia, Excelência e Inclusão” é composta pelo atual vice-Reitor Gilmar Pereira, que está candidato a reitor, e pela Professora Loiane Prado, Pró-Reitora de Ensino da Graduação (Proeg), candidata a vice; Denise Machado (reitora) e Patrícia Bittencourt (vice)  encabeçam uma chapa “Coletivo Denise Patrícia” fruto de um racha da atual gestão. Aertamente como oposição se apresentam as chapas “democracia e diálogos da UFPA” de  Armando Lírio (reitor) e Eliana Franco (vice) e  a chapa “Humanizar, Empreender e Inovar” de Hito Braga (reitor) e Marilena Loureiro (vice).

A eleição ocorre em meio à greve nacional dos técnico-administrativos em educação (Taes), da iminente greve dos professores, da crise orçamentária pela qual passam as universidades e serviços públicos, do processo de privatização da educação e da política econômica que privilegia o pagamento da dívida pública em detrimento de investimentos nas áreas sociais (expressa no Arcabouço Fiscal do governo Lula-Alckmin).

Na greve técnico-administrativa há, além da pauta nacional por salário e reestruturação de carreira, pauta local da UFPA que inclui temas importantes como a luta pela jornada de 30h, contra o ponto eletrônico, pelo combate ao assédio moral, por paridade nos órgãos de decisão da universidade e mais democracia, revogação do contrato com a Ebserh nos Hospitais Universitários, temas que cuja resolução passa também pela gestão da universidade, de onde se pode enfrentar e questionar a política do governo federal, pautando-se na autonomia administrativa garantida constitucionalmente.

Nesse sentido, nós da Corrente Socialista de Trabalhadoras e Trabalhadores (CST) e da Combate Sindical queremos fazer reflexões sobre essa eleição e seus candidatos (as), a atual política do governo Lula para a educação superior, a atual gestão da universidade e qual programa necessitamos no âmbito político nacional e local (UFPA) para conquistarmos a universidade 100% pública, gratuita e de qualidade, aberta ao povo trabalhador, radicalmente democrática e que tenha seus esforços voltados para resolver os problemas da classe trabalhadora, dos povos originários e de todos os setores oprimidos da sociedade.

 

Governo Lula mantém política de cortes orçamentários e de privatizações

 

O ano de 2024 começou com um orçamento reduzido para as universidades. A Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2024 votou um corte nominal de 310 milhões para as universidades em relação ao orçamento aplicado em 2023. O orçamento para as universidades federais ficou em R$5,9 bilhões no total. 

A Associação dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) denunciou, em nota, serem necessários, no mínimo, mais R$2,5 bilhões para que as universidades federais possam arcar somente com a política de assistência estudantil e contas básicas até o final do ano.

Esse corte de verbas afeta diretamente os estudantes mais vulneráveis economicamente, prejudicando a permanência na universidade: são filas quilométricas no Restaurante Universitário (RU), falta de bolsas e RU nos campi fora de sede, estruturas precárias, perdas na qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão, problemas para garantir a inclusão e permanência dos indígenas, quilombolas, refugiados e deficientes que entram na universidade. 

Além disso, o governo Lula não aceitou revogar os decretos de Temer e Bolsonaro que proíbem concursos para diversos cargos Tae, o que tem aumentado a terceirização na universidade. Faltam concursos públicos para repor o déficit de servidores, algo que até agora o governo Lula-Alckmin também não se propôs a fazer.

Para servidores e docentes, a política atual resulta em sobrecarga de trabalho, déficit de pessoal e em assédio moral. 

O Quadro de Referência de Técnico-Administrativos da UFPA possui  apenas 2.583 cargos ( sendo que deste 212 estão vagos ) para dar conta de uma das maiores universidades do país que conta hoje com mais de 50 mil alunos. Além disso, os baixos salários, a carreira defasada, a precarização e o assédio moral são uma das várias causas da alta rotatividade na categoria.

 

A UFPA tem que ser independente dos governos, mas a atual gestão não se posiciona dessa forma 

 

São muitos os problemas em nossa universidade: a política de cortes orçamentários e terceirização gera sucateamento e precarização na universidade. Em nome dessas políticas de austeridade se impõe também uma privatização silenciosa da instituição, com a presença de  fundações privadas ditas de apoio, cobrança de taxas, cursos de extensão e pós-graduação pagos, a criação da EBSERH que entregou a gestão dos HUs nas mãos de uma empresa pública de caráter privado que visa o lucro e pode cobrar por serviços – o que ainda não ocorre nacionalmente devido à resistência nas universidades. 

O Fundo Patrimonial, aprovado pela atual gestão para supostamente ter mais verbas para pesquisa, segue a lógica do Future-se de Bolsonaro e visa captar verbas de grandes empresas e pessoas físicas doadoras e colocar esse fundo na Bolsa de Valores, política que fortalece a perspectiva privatizante na educação superior. Conheça mais sobre esse tema em materia da Adufpa (https://adufpa.org.br/2022/02/07/contra-a-mercantilizacao-e-privatizacao-da-ufpa/).

Em 2021, a atual gestão, da qual Gilmar é vice-reitor, tentou implantar o ponto eletrônico para os servidores Taes, supostamente por estar sendo cobrada pelos órgãos de controle. A mobilização da categoria organizada pelo Sindtifes-PA, da qual nós da Combate fomos parte ativa, fez que o reitor Emmanuel Tourinho voltasse atrás. 

Tourinho também prometeu em sua campanha implementar a jornada de 30 horas, mas não levou o processo a frente. No tema do assédio moral, a gestão fez uma campanha após mobilização do sindicato, mas segue mantendo gestores assediadores no segundo escalão, mesmo com as denúncias da categoria.

Não bastasse tudo isso, permanecem nas universidades normas e condutas antidemocráticas como a atual estrutura de gestão, onde os órgãos colegiados têm de ser compostos por 70% de docentes. Além disso, os TAEs são impedidos de ocupar função de  Reitor, Diretor de Unidade Acadêmica e de Campus.  

As unidades administrativas, como a Biblioteca Central, a Prefeitura do Campus, o Ciac, Ceps, Arquivo e Pró-Reitorias não têm seus dirigentes eleitos pelos servidores e não têm órgãos colegiados de decisão. Nesses locais há muitos casos de assédio moral e de falta de democracia. 

A atual gestão, infelizmente, não propôs nenhuma mudança para democratizar de fato a UFPA com a paridade e se diz abertamente contra eleições para as unidades administrativas.

Sabemos que a solução desses problemas não é prerrogativa somente da reitoria, mas uma postura de enfrentamento ou de omissão frente a essas questões é determinante. Um reitor pode, se tiver vontade política e utilizar a prerrogativa da autonomia universitária garantida pela Constituição Federal, garantir a jornada 30h para os TAES, combater o assédio moral de forma efetiva, enfrentar as terceirizações, a cobrança de taxas e os cursos pagos, democratizar os órgãos de decisão da universidade garantindo a paridade, como também rever o contrato com a Ebserh, assumindo o controle dos Hospitais Universitários (como ainda ocorre na Ufrj), dentre outros exemplos.

Por tudo isso sempre nos mantivemos independentes e na oposição a atual gestão da Reitoria da UFPA. 

 

Faltou uma oposição consequente nessas eleições.

 

A gestão Tourinho-Gilmar deixou muito a desejar no enfrentamento dessas questões.  Tida como progressista por parte do movimento sindical e estudantil, a atual gestão apesar de ter tido posições corretas na denúncia de políticas bolsonaristas, na maior parte das vezes atuou como aplicadora das políticas de precarização da universidade como as tercerizações, o aumento do preço do RU para TAEs, a recusa em implantar uma política que garanta as 30h para a categoria e a tentativa de aplicação do ponto eletrônico em 2021.

Em 2020, frente a ameaça de intervenção de Bolsonaro, votamos criticamente na atual gestão para derrotar o candidato bolsonarista. No entanto, não reivindicamos sua gestão nem vemos condições de repetir esse voto. A chapa Gilmar-Loyane representa a continuidade de uma política de “morde-e-assopra” sobre os servidores, que têm discursos de defesa de direitos, mas na prática não enfrenta assediadores e nem avança em direitos para a comunidade acadêmica. 

Infelizmente, uma leitura atenta  do programa das  demais chapas mostra que nenhuma delas se propõe a enfrentar de fato essas questões principais que aqui elencamos. Salta aos olhos, por exemplo,  que a maioria das chapas sequer falam diretamente sobre o enfrentamento ao assédio moral contra servidores e que nenhuma das chapas tenha um posicionamento firme contra as terceirizações ou contra as políticas de cortes de verbas na universidade. 

Esses são temas importantes pois sem enfrentar e posicionar-se sobre questões que geram grande parte dos problemas das universidade, todas as chapas se tornam mais do mesmo, todas com muita promessas mas no fim estão pouco comprometidas com as mudanças que a comunidade acadêmica e a universidade pública necessitam.

No debate promovido pela Adufpa, Sindtifes-PA e DCE, ficou bem explicado a todos a limitação do programa de todas as chapas: numa pergunta sobre a jornada de 30 horas e sobre o ponto eletrônico, nenhum dos candidatos se comprometeu a não implementar o ponto eletrônico e a garantir as 30h para toda a categoria. 

No tema da paridade e da democratização da estrutura da UFPA, também nenhuma chapa se compromete com a luta pela mudança da atual estrutura antidemocrática na qual os docentes tem peso de 70% dos Conselhos Superiores e órgãos colegiados. 

Fez falta uma chapa do movimento sindical que trouxesse de fato toda a pauta histórica dos TAES, dos docentes e do movimento estudantil, denunciando as políticas macros de destruição da universidade e comprometidas de fato com a Educação 100% pública, gratuita e de qualidade, a exemplo do que foi em 2016 a chapa das professoras Vera Jacob (ICED) e Sandra Helena (ICSA). Foi por chapas com esse perfil que nós da CST e da Combate Sindical sempre batalhamos. Foi esse tipo de chapas que apoiamos e fizemos campanha ao longo de sucessivas eleições na UFPA. Infelizmente na atual eleição nenhuma chapa se propõe a defender esse programa, por isso não vamos apoiar nenhuma candidatura no pleito atual.

Sabemos que muitos companheiros e companheiras estão decidindo seu voto. Alguns votarão para mudar a atual situação e nós também queremos que ela mude. Outros votarão para barrar projetos de direita e privatista como o representado abertamente por Hito, e nós também defendemos que nenhum voto seja dado em quem defende abertamente entregar a UFPA nas mãos da iniciativa privada. 

Por isso reafirmamos que independente de qual chapa seja vencedora no atual pleito, as mudanças que de fato queremos só serão conquistadas com muita luta dos movimentos dos técnico-administrativos, dos estudantes e dos docentes de forma independente da Reitoria e do governo Lula-Alckmin, contando ainda com ampla participação da classe trabalhadora e dos setores populares, em mobilizações unificadas. A unificação que buscamos construir na atual greve da educação federal expressa essa politica.

Seguiremos defendendo nessas eleições, em diálogo com as categorias, e depois do pleito, que todo o movimento social combativo lute pela universidade que queremos.

Avaliamos que a UFPA deve se tornar uma trincheira de enfrentamento às politicas neoliberais para a educação superior. Uma gestão que enfrentasse as orientações privatizantes e de precarização da educação poderia se tornar um exemplo nacional e construir um movimento amplo de resistência. É para que a universidade se torne essa trincheira que militamos todos os dias e estamos construindo as lutas e greves da comunidade acadêmica.

Infelizmente a universidade pública hoje em dia tem cada vez mais cedido espaço aos interesses de médias, grandes empresas e multinacionais, o que desvirtua seu caráter. Saudamos os que resistem e mantêm a universidade a serviço dos trabalhadores e do povo pobre, fazendo ensino, pesquisa e extensão para transformar a sociedade e não para gerar lucro para poucos.

Para nós, o programa abaixo resume os principais desafios e tarefas que temos pela frente na busca da construção de uma universidade 100% pública, gratuita, de qualidade, profundamente democrática, e a serviço de resolver os problemas mais sentidos pela classe trabalhadora e pelos povos:

 

1- A Reitoria deve ser independente diante do governo federal para cobrar e enfrentar suas políticas quando for necessário,  como agora no momento de greve, de corte de orçamento e de política de precarização com as terceirizações e as privatizações (Ebersh);

2- Lutar pela garantia da autonomia administrativa e financeira da universidade; 

3- Apoio público da Reitoria às pautas dos SPFs e estudantes diante do governo; 

4- Jornada de 30 horas para todos os Taes, sem redução de salário;

5- Não ao ponto eletrônico; 

6- Mais verbas para assistência estudantil: Mais R.Us no Guamá e em todos os campi fora de sede, R.U gratuito para os estudantes; Moradia estudantil para todos os que precisam. Mais bolsas e que seja de um salário mínimo.

7- Política efetiva de educação e punição contra os assédios e opressões na UFPA; 

8- Paridade nos Conselhos Superiores e órgãos colegiados da universidade; 

9- Eleição dos dirigentes das unidades administrativas da UFPA e a instituição de órgãos colegiados nesses setores;

10- Que os TAEs possam concorrer aos cargo de direção da UFPA, inclusive à Reitor;

11- Realização de um plebiscito na UFPA para rever o contrato com a EBSERH nos HUs, realização de concurso público para os HUs com os códigos de vaga dos HUs; 

12- Política de qualificação que garanta reserva de vaga para TAEs, regulamentação do afastamento e aumento da quantidade de bolsas PROQUALI.

13- Nenhuma cobrança de taxa na Ufpa, nenhum curso pago, nenhum convênio com empresas privadas e revogação do Fundo Patrinominial. UFPA 100% pública e gratuita.

14- Não às terceirizações. A UFPA deve se posicionar publicamente contra as terceirizações, deve exigir do governo concursos públicos para cobrir todo o déficit de pessoal e deve denunciar à sociedade esse déficit para fazer pressão sobre o governo.